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Carmen Valente Barbas| A heroína que salvou a própria vida

Carmen Valente Barbas é conhecida internacionalmente por sua contribuição para o aperfeiçoamento de técnicas de ventilação mecânica

Você já ouviu falar da Carmen Valente Barbas? Ela é a médica que ajudou a criar um método de ventilação mecânica, usada no tratamento de casos graves de covid-19. Apesar disso já ser um grande feito, essa história é muito mais inspiradora do que parece. Confira a história de como uma mulher que dedicou a carreira a salvar vidas e formar médicos, teve sua vida salva pelas técnicas que ajudou a criar.

Quem é Carmen?

Filha do também pneumologista e ex-professor da Faculdade de Medicina da USP João Valente Barbas, Carmen seguiu os passos do pai. Ela se formou na USP e ali iniciou, em 1995, seu doutorado em ventilação mecânica.

Em 1998, um estudo clínico liderado por ela e pelo colega Marcelo Amato foi publicado na New England Journal, revista científica americana de grande impacto.

Até então, as chances de um paciente com doença pulmonar aguda morrer ao receber ventilação mecânica eram altas.

Em sua pesquisa, Carmen e seu grupo levantaram a hipótese de que a própria ventilação pudesse estar danificando o pulmão dos pacientes.

“Estávamos estudando a ventilação mecânica em pacientes com Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo, a SDRA”, diz Carmem à BBC News Brasil. “Na época, a mortalidade dessa síndrome era 70%, então, todo mundo que trabalhava em terapia intensiva ficava desanimado, porque você ventilava o paciente e 70% deles morriam.”

Ao final do estudo clínico, o número de mortes entre pacientes tratados com a nova técnica caiu para 40%. Em 2000, um grande estudo americano confirmou, também na New England Journal, que a abordagem do grupo da USP era muito melhor.

Desde então, o índice de mortes de pacientes com SDRA caiu ainda mais, para 30%. E a equipe liderada por Carmen e Amato ganhou voz internacional, ajudando a transformar a ventilação mecânica no mundo.

O início do novo coronavírus

Em março de 2020, médicos brasileiros começavam a constatar que o novo coronavírus era realmente perigoso.

“Estudando vírus desde muitos anos, a gente vê que esse novo vírus é muito diferente, muito agressivo, sobrevive em temperaturas muito altas, o que não é normal para vírus respiratórios”, diz Carmen.

Ela conta que chegou até a escrever um artigo para a Sociedade Paulista de Terapia Intensiva esclarecendo a população sobre o coronavírus. Por sua idade, e por ser hipertensa, Carmem pertencia ao grupo de risco.

“Estava tomando todas as medidas preventivas, atendendo pacientes de máscara, não deixando eles chegarem muito perto. Com colegas, fui uma das primeiras a dizer, ‘não chega perto, vamos manter distância’. Parei de beijar os colegas, de dar a mão para os pacientes, sempre com o álcool gel pendurado na bolsa.”

No dia 19 de março, os primeiros sintomas começavam a aparecer.

“Comecei a ter um pouquinho de dor de garganta, um pouquinho de tosse, uma dor no corpo bastante importante.”

Carmen tomou a decisão de ir até o hospital pedir para ser testada. Mas por não ter os sintomas clássicos, como por exemplo: febre e oxidação baixa, teve de insistir. O teste feito no dia 23, teve o resultado revelado no dia 27, era positivo, a médica havia contraído a covid-19

“Vi no computador, positivo. Telefonei para os colegas pedindo para ser internada porque eu estava muito cansada.”

Dilema na UTI

Carmen foi para o hospital Albert Einstein, onde trabalha há mais de 30 anos como intensivista. Inicialmente, seu estado não era crítico, então foi encaminhada à enfermaria. Mas como é comum em pacientes com Covid-19, não demorou muito e seu quadro agravou.

“Fui internada no dia 27 à noite. Dia 29 de manhã já me levaram para a UTI e me intubaram porque eu estava com um quadro de insuficiência respiratória grave.”

Ela tinha dedicado a carreira aos pacientes, ao ensino e à ciência. Agora, Carmen confiava sua própria vida à técnica que ajudara a desenvolver e aos médicos que treinara.

“Fui para a UTI. Os colegas já estavam todos lá, pessoas conhecidas”, lembra Carmen.

“Quando você está se sentindo mal, quer aliviar aquilo. Eu estava tão desconfortável, com tanta falta de ar, que na hora que fui anestesiada, aquilo me aliviou.”

Na liderança da equipe que iria intubar e cuidar da ventilação mecânica de Carmen estava um ex-aluno de doutorado da médica, o intensivista e clínico geral carioca Gustavo Faissol Janot. Ele trabalha com Carmen há 16 anos.

“A Carmen sempre foi nossa grande mentora. Vê-la doente, com necessidade de intubação, foi um dos momentos mais difíceis, senão o mais difícil, da minha carreira”, diz Janot à BBC Brasil

A pressão sobre ele foi tão grande que Janot decidiu sair da sala.

“Nesse momento, dada minha proximidade com ela, pedi para não estar presente na intubação”, diz.

A notícia chega ao exterior

O colega e amigo de Carmen, italiano Paolo Pelosi é surpreendido por uma mensagem no seu celular.

“Então, chegou uma mensagem de um colega no Brasil. Já era quase meia noite: Carmen foi internada e vai ser intubada. Uau, como assim?”, lembra Pelosi.

“Quando você trata um paciente, é como se estivesse protegido, aquilo não vai atingir você. É um recurso psicológico, uma atitude que te permite reagir àquela situação”, explica. “Mas quando acontece com uma amiga e colega, é como se estivesse acontecendo com você.”

Além disso, Gustavo Janot tenta explicar o sentimento de consternação que tomou conta de muitos médicos – entre eles, o experiente Paulo Saldiva, ex-professor de Carmen, que se emocionara no programa de TV: “Primeiro, pela pessoa que ela é, de bom coração, incansável em ensinar e ajudar”, diz.

“Segundo, pelo que ela representa na ventilação mecânica. Terceiro, porque ela é uma de nós. E nós, médicos, na linha de frente, todos ficamos com medo.”

“Quem não queria poder perguntar para ela o que fazer naquela hora?”, diz Janot.

Carmen retorna aos trabalhos

Carmen recebeu alta do hospital no dia 20 de abril. No início de junho, sem apresentar sequelas, mas ainda fazendo fisioterapia, voltou ao trabalho. Além disso, ela diz que não sabe como contraiu a covid-19, mas não acha que foi durante atendimento.

“(Acho que peguei o vírus de) alguém que estava contaminado assintomático e que chegou muito perto, ou dentro do elevador no hospital”, conta.

Portanto, todo cuidado é pouco. Ela está atendendo pacientes com coronavírus, mas usa todos os equipamentos de proteção individual, os EPIs.

“Eles (os cientistas) não têm certeza se a defesa que você adquire depois que fica doente é permanente e se ela te defende se você tomar uma carga muito alta (do vírus).”

Combatendo à covid-19 no Brasil

Primeiro, precisamos esclarecer a população.

“Os serviços de imprensa e o governo têm que ser muito transparentes. A gente vê que está acontecendo algum problema. Não estão querendo ver a realidade das coisas”, diz.

“É muito importante ver a realidade das coisas e ser transparente.”

“A população precisa entender que tem um vírus que é altamente infectante, que 5% vão evoluir para a intubação. Só 5%.”

“Acho que isso tranquiliza a população. Mas a população precisa saber que está passando a doença.”

Com a população fazendo a sua parte, resta organizar melhor o atendimento e treinar os profissionais, começando com a triagem dos doentes.

Em conclusão, sabemos da gravidade da doença e devemos continuar nos protegendo. Mas nos conforta saber que nossos heróis são altamente capacitados e estão empenhados na luta contra o novo coronavírus. O Minuto Saúde e Bem-Estar segue de olho nas notícias para sempre mantê-los informados.

Referências: bbc.com

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